Seu Jovino é assim, um homem simples, bisneto de escravo, fala suave e coração grande. Seu bisavô, fugindo da escravidão, refugiou-se nas serras de difícil acesso no norte do estado de Goiás. Foi lá, em Vão das Almas, uma comunidade Kalunga remanescente dos quilombos, que seu Jovino cresceu plantando mandioca, fazendo farinha e vendendo em Cavalcante, cidade ao pé da serra. Aos dezoito anos seu Jovino já era chamado pelos grandes fazendeiros da região para domesticar cavalos bravos e arredios. E nestas idas e vindas de Vão das Almas para as fazendas, conheceu Albertina. Uma moça Kalunga, da comunidade do Engenho II que tinha no olhar a cor da jabuticaba e a beleza da terna mocidade. Jovino, um rapaz maduro, de 28 anos e com muitas aventuras para contar, casou-se com a jovem Albertina, de apenas dezesseis anos.
Um amor que veio para ficar e fazer história. Trinta e seis anos de união, sete filhos, sete netos. Como seu jovino mesmo diz “Casar é fácil, separar é mais fácil ainda”. As filhas, separadas saíram da região à procura de emprego. Seu Jovino e Dona Albertina abraçaram os netos e hoje cuidam da criação da meninada. Seu Jovino é guia turístico em Cavalcante-GO e não se descuida de dar continuidade às tradições de seus antepassados. Faz questão de repassar para seus netos, para os turistas que visitam a região como também para a comunidade de Cavalcante, a Folia do Divino Pai Eterno, que anualmente faz em sua casa. Um ritual de fé e religiosidade que herdou de seus antepassados.
Toda a família participa da preparação para a Folia do Divino Pai Eterno. Trabalham na arrumação do altar, limpeza da casa e do terreiro, além do preparo da farta alimentação. A folia gira a cidade e para na casa do Imperador (Jovino), onde é celebrado o culto ao Divino Pai Eterno. Na Bandeira do Divino as pessoas amarram donativos em agradecimento às graças recebidas.
O Alferes da Bandeira entra na casa do Imperador juntamente com toda comunidade cantando cantigas de louvor ao Divino Pai Eterno e param diante do altar.
Depois dos cantos e das rezas é servido o jantar e a festa segue animada ao som do pandeiro e do violão.
Seu Jovino atua no grupo de dança folclórica da comunidade Kalunga, apresentando danças e cantos tradicionais, entre elas a Sussa.
Nosso país é riquíssimo em diversidade cultural. Vivemos um momento muito importante com a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial e iniciativas como a do sr. Jovino, de fomentar as tradições que foram os pilares da construção da nossa identidade cultural e religiosa nos faz acreditar que é possível preservar a cultura das comunidades remanescentes dos quilombos no Brasil.
Custódia Wolney.