Esta narrativa foi selecionada para participar da Primeira Antologia Brasil Itália – Vozes Italo-Brasileiras I. Parceria entre a REBRA – Rede de escritoras brasileiras e o COMITÊ/SP – Comitato degli Italiani all’estero – com a coordenação e organização de Rosalie Gallo, sendo publicado nas duas línguas pátrias.
Laços Milanesi & Bombonato
Fico pensando na grandiosidade da natureza humana que rompe barreiras e se congrega em uma só nação, onde a força do sangue e dos laços hereditários fala mais alto do que limites territoriais ou mapas geográficos.
Nos belos campos de Portogruaro em Veneza, no século XIX, um grande casarão abrigava a família Milanesi. Havia o burburinho gostoso de crianças peraltas, descalças e falantes. O alvoroço de mulheres na cozinha, aonde o cheiro de seus temperos chegava até os campos, atraindo seus maridos que tangiam o gado, fazendo-os voltar para o seio de suas amadas.
Os varões se casavam e traziam suas mulheres para o casarão, que abria seus braços para acolhê-las. Conta a história, que uma linda jovem, filha da lavadeira, trabalhava para a família Milanesi e apaixonou-se por um dos filhos, Bernardo.
Os homens cuidavam do gado, apenas Bernardo não participava daquela tarefa. Passava o dia a andar pela casa. Ora falante, ora obtuso. Ora sorridente, ora triste fechado em seu mundo. Este era Bernardo, uma incógnita. À Margaritha, não importava o que os outros diziam: que Bernardo não era normal, que falava coisas desconexas e tinha variações de humor.
Dona Bianca, acreditando que seu filho não conseguiria casamento melhor, consentiu no enlace de Bernardo com Margaritha, a linda filha da lavadeira.
O tempo passou. O casal teve seis filhos saudáveis. Ao lado de Bernardo, Margaritha se sentia uma mulher plena. Ela entendia o mundo dele e o aceitava como ele era.
Mas a vida é cheia de surpresas a algumas amarguras, e, em uma triste noite, Bernardo tirou sua vida com uma grande dose de veneno. Margaritha, com seis filhos, viu seu mundo desabar.
Viver sem o Bernardo estava sendo muito difícil, Porém, os problemas estavam apenas começando. Margaritha, de origem humilde tinha seus encantos. Com isto, algumas outras mulheres que também moravam no casarão, esposas dos irmãos de Bernardo, com ciúmes dela, começaram a fazer intriga e ela foi obrigada a ir embora.
Por alguns dias perambulou, com seus filhos, pelas vielas de Portogruaro, até que decidiu partir para o Brasil, junto a um grande grupo de italianos dispostos a trabalhar nas lavouras de café, em São Paulo. Seguiu para Gênova e acomodou-se em um precário albergue aguardando o dia do embarque.
Seguiram amontoados no porão do navio, com poucas condições de higiene, o que facilitou a propagação da peste bubônica. No Brasil, as autoridades mandaram que o navio atracasse na Ilha Grande, onde permaneceu de quarentena. Nesta ilha, Margaritha perdeu seu primogênito que foi picado por uma cobra. A dor, novamente, dilacerou seu peito.
O Brasil tornou-se o esteio que acolheu aquela sofrida mulher e seus filhos, que traziam nas veias o pulsar do sangue Milanesi, porque um amor tão puro como o de Margaritha e Bernardo jamais se esvai.
O tempo passou, Margaritha morreu, deixando seus filhos, já adultos, em uma fazenda em Batatais, São Paulo. Cada um seguia seu rumo, como a vida consentia.
Na Itália, a migração continuava, e, na província de Rovigo, região de Vêneto, o jovem João Geovanni Bombonato, se despedia da Itália. Estava decidido a tentar uma nova vida no Brasil, e fugir da crise econômica que assolava seu país.
Rita Milanesi, filha de Margaritha, trabalhava com afinco na fazenda, em Batatais, sem conseguir pagar a dívida do armazém, e com isto, não poderia sair de lá. Certo dia, cansada do trabalho, sentou-se em um banco no quintal dos fundos da casa grande e percebeu a presença marcante de um lindo jovem italiano, que disposto e sorridente, chegara para trabalhar na construção de uma nova casa na fazenda.
Entre conversas e danças típicas que os italianos faziam para lembrar a Itália, Rita Milanesi e Geovanni Bombonato se conheceram e se aproximavam cada dia mais e mais.
Geovanni Bombonato era um jovem de opiniões próprias e que não desistia de alcançar seus objetivos. Ele morava em um bairro modesto de São Paulo, e Rita Milanesi não poderia deixar a fazenda enquanto não quitasse a grande dívida. Geovanni Bombonato, apaixonado como estava, e decidido a viver aquele grande amor, resolveu fugir com Rita Milanesi e libertá-la daquela escravidão branca.
Milanesi e bombonato, no Brasil, fizeram florescer o amor em uma descendência que traz no peito o patriotismo brasileiro e o sentimento de pertencimento à Itália.
E assim se construiu a riqueza da diversidade cultural brasileira. Diferentes etnias, costumes e tradições fazem de nossa pátria um grande celeiro cultural. Elos de cumplicidade e cidadania com a Itália são fortalecidos ao longo dos anos e o pulsar Milanesi e Bombonato continuará a florescer nos filhos do Brasil, fazendo história.
Hoje, variações como Milanezi, Milanez , Milanês e Bombonatti, representam, no Brasil, nossa amada descendência.
Por uma descendente Milanesi & Bombonato
Custódia Wolney